Pesquisadora da Fundaj analisa representação de instrumentos musicais em obras de Bajado
Trabalho de Betty Lacerda retrata o resgate de Olinda como uma cidade musical nas obras do artista
Boêmios, brincantes, seresteiros, repentista e arruaceiros. Das 18 pinturas do pernambucano Bajado no acervo da Fundação Joaquim Nabuco (Fundaj), 9 delas trazem imagens de instrumentos musicais. As crônicas que o artista pintou da musicalidade de Olinda nos anos 1960 foram objeto de análise do trabalho que a pesquisadora da Fundaj Betty Lacerda apresentou nesta sexta-feira (26) no 5º Congresso Brasileiro de Iconografia Musical, promovido pela Universidade Federal da Bahia.
“Bajado pintava músicos com instrumentos utilizados em festejos de maracatu, bloco de frevo, circo, repente, e especialmente o carnaval. O que eu analiso a partir da iconografia musical é essa representação dos instrumentos e de todo universo musical que ele conseguia observar de sua janela em Olinda”, explica Betty Lacerda. De acordo com a pesquisa, o olindense participava de muitos desses grupos não só como artista criador, mas como folião. “Através de seu trabalho, o artista alimenta, bebe e interpreta esse mundo. O artista acrescenta à essência visual da cidade uma forma, uma maneira de expressão, uma linguagem visual que a identifica e a distingue das demais cidades com perfil e história semelhantes.”
Para Bajado, Olinda é uma cidade musical. Em muitas de suas pinturas, ele retratava figuras como seresteiros cantando e tocando no Sítio Histórico nas noites olindenses, tomando cuidado de registrar os instrumentos musicais utilizados nos grupos carnavalescos, visto que o cortejo de personagens e fantasias são sempre acompanhados por verdadeiras orquestras seguindo a sonoridade de cada gênero.Como alguém que teve acesso apenas a estudos primários e nunca qualquer formação artística, Bajado buscava inspiração para seus quadros em gibis e filmes que ajudava a projetar no seus anos de Cine Olinda.
Essa representação que resgata a essência é a cidade de Olinda, seus habitantes, personagens marcantes, acontecimentos e as festas populares, traz um paralelo entre a cidade no ano de 1964 e agora. “Você olha para a obra e parece que está vendo as festas de Olinda de hoje em dia. Ele retrata com muita fidelidade o povo das ruas.” A técnica de pintura que encontra para se expressar bebe da fonte das histórias em quadrinhos, comics e bandas desenhadas. Figuras com grossos contornos em preto, cores básicas e poucas nuances acompanham a marca registrada do pintor: uma inscrição “Bajado, um artista de Olinda” acompanhado de um autorretrato. Segundo Betty, é uma forma de quebrar a quarta parede entre a pintura e o artista.
A Coleção Bajado da Fundação Joaquim Nabuco é oriunda do antigo Museu de Arte Popular, mais tarde, reunido ao Museu de Antropologia, também da Fundaj, e ao Museu do Açúcar, dando origem ao atual Museu do Homem do Nordeste.
O ARTISTA
Euclides Francisco Amâncio (1912-1996), mais conhecido como Bajado, seu apelido de infância, foi um pintor, desenhista e cartazista brasileiro. Nasceu em Maraial, pequena cidade da Zona da Mata Sul de Pernambuco. Aos 13 anos muda-se para a vizinha Catende, trabalha no cinema local produzindo cartazes para os filmes e desenha histórias em quadrinhos inspiradas nos filmes que assistia. Aos dezoito anos, passa a viver e trabalhar no Recife, produzindo painéis publicitários para várias lojas da capital. Dois anos mais tarde, emprega-se em uma gráfica como linotipista.
Muda-se para Olinda em 1933, trabalhando no Cine Olinda como cartazista até 1950. Olinda é tida como a cidade dos artistas e do Carnaval e, de imediato, Bajado envolve-se com essa grandiosa festa, participando de diversos blocos, criando bonecos e estandartes. Bajado adota Olinda como o seu lugar – e a cidade o recebe como a um filho da terra, um autêntico olindense. É a partir daí que o trabalho artístico se mostra como uma alternativa de sobrevivência para o artista que passa a assinar suas pinturas com a frase Bajado, um artista de Olinda. A inscrição tanto aparece na face da pintura quanto no verso. Nesse caso, a inscrição é acompanhada por um autorretrato.
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