Fundaj lança olhar às artes plásticas e ao Carnaval no período pandêmico
Em live do projeto Tecnologia para Vencer a Crise, desta quinta (4) produtores refletem preocupações com impactos da pandemia na agenda cultural e desvalorização do trabalho
De um lado, o desafio de pensar o Carnaval pós-pandemia do coronavírus (Covid-19) no Brasil e da manutenção das produções que asseguram a beleza do festejo de Momo. Do outro, a subvalorização das artes plásticas em um mundo contemporâneo bombardeado pelas fake news e pela massificação. A edição do Tecnologia para vencer a crise, na tarde desta quinta-feira (4), recebeu os artistas Sílvio Botelho e Cavani Rosas. Assumindo o bate-papo o jornalista Marcelo Pereira, cuja trajetória acompanhando o mercado cultural já soma três décadas.
O encontro, promovido pela Fundação Joaquim Nabuco, integra uma sequência de atividades que visam refletir os impactos da crise sanitária em diversas áreas e vislumbrar alternativas a partir da experiência de diversos profissionais. Diante do isolamento social sugerido como medida para reduzir a proliferação do novo vírus, em março deste ano, as produções passam a ser ainda mais individualizadas e os agentes culturais se deparam com a necessidade de antever futuros possíveis à manutenção de seus trabalhos e orçamentos.
No passado recente, o artista plástico olindense Sílvio Botelho lembra, que o Carnaval era simples e a brincadeira variava entre as poucas agremiações e o bater de latas. Hoje, a dimensão da festa é tão maior, que causa problemas. “O volume de pessoas no Sítio Histórico [de Olinda] atrapalha o fluxo das próprias agremiações, que se preparam ao longo de todo o ano”, observa. No entanto, não há folia sem gente. “Nunca houve um Carnaval virtual, onde as pessoas não fossem às ruas. Até é possível assistir em filmes, mas brincar o festejo não”, defende, categórico.
Sílvio é respeitado pela confecção de uma das principais alegorias da festa: os bonecos gigantes. Ao longo de 46 anos, produziu 1.320. Dentre eles, o Menino da Tarde, filho do Homem da Meia-Noite (Patrimônio Vivo de Pernambuco) e da Mulher do Dia. A sua primeira produção, entre 1973 e 1974, e que revela ser a preferida. “Os bonecos gigantes fazem parte desse imenso cenário que é Olinda. Como é que eles poderão voltar? Como nós voltaremos à tona, em meio a este novo momento?”, questiona, ao lembrar artistas como João Andrade.
A alternativa tem sido a imersão. “Estou aproveitando para estudar formas de continuar e até otimizar minha produção. Para isso, tenho me valido da experiência de outros países em meio à pandemia ou pós-isolamento.” Sobre o uso de recursos tecnológicos para a confecção das calungas, como impressão em 3D, é contundente. “A tecnologia avança, mas o carinho da mão é de uma mãe. Da máquina, é frio. Nossas produções são manuais e artesanais. É isso que agrega valor. Mesmo que seja financeiramente é culturalmente inviável”, conclui.
Outro defensor da produção autoral, o desenhista e escultor Cavani Rosas contou dos trabalhos assumidos neste período, da relação com o público e dos projetos para um futuro ainda incerto. Desde os primeiros desenhos na infância até a primeira exposição no Exterior, a introspecção sempre foi importante. “Quando você trabalha com arte, você vive um certo isolamento natural. Dependendo da técnica ou do custo, há uma distribuição de tempo e de dedicação”, aponta o artista, que recordou as inspirações que moldaram sua construção estética.
Influenciado pelo cinema, recordou o longa 2001: uma odisseia no espaço, dirigido por Stanley Kubrick, para falar de pós-modernidade e distopia. Criticou a falta de critério no consumo de conteúdo da Era da Informação e a desvalorização do trabalho dos artista plásticos. “Há um desafio para a precificação de obras no Brasil. Sobretudo para aqueles que não trabalham com tela. É preciso considerar as horas de trabalho, o material empregado e o trabalho intelectual. Por isso, tenho apostado no mercado internacional”, disse.
No entanto, para a manutenção do trabalho, neste período, a flexibilização tem sido sua alternativa. Além dos trabalhos de ilustração, com a qual trabalha desde as passagens pelos jornais Diario de Pernambuco e Folha de S. Paulo, tem aderido a arte sob encomenda. Mesmo quando o trabalho destoa dos preferíveis tons P&B. “Fico pensando em futuro, mas as surpresas que a história nos dão dificultam as apostas. Sair do Brasil parece uma saída, mas também não dá pra todos irem embora. É preciso restaurar os incentivos à cultura no País”, finaliza.
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