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A árvore que sangra: tempo para Iroko estreia em galerias da Fundaj

Publicado: Sexta, 24 de Setembro de 2021, 22h03 | Última atualização em Segunda, 18 de Outubro de 2021, 11h00 | Acessos: 429

Exposição da artista Dália Rosenthal toca feridas da intolerância contra religiões de matriz africana

Os ancestrais do Sítio de Pai Adão foram queimados. Pai, mãe, avós, bisavós e toda ascendência dos membros do Terreiro de Candomblé Obá Ogunté habitavam a gameleira-branca, um crime patrimonial e ambiental cometido pela intolerância religiosa. O atentado ocorreu em setembro de 2018, em Água Fria, bairro da Zona Norte do Recife, onde está localizado o terreiro. Nesta sexta-feira (24), ele é remexido na exposição "Tempo para Iroko", da artista visual e pesquisadora Dália Rosenthal, e ocupa as galerias Massangana e Baobá, no Complexo Cultural Gilberto Freyre, sede da Fundação Joaquim Nabuco, em Casa Forte.

A mostra e investigação é resultado da quinta edição do projeto Residências Artísticas, da Diretoria de Memória, Educação, Cultura e Arte (Dimeca), da Fundaj. Nela, o visitante imerge na tragédia que neste ano completará três anos. Uma projeção em vídeo da árvore sagrada queimando, produzida pela artista na semana do crime, nos transporta para o local. Depoimentos dos babalorixás Manoel Papai, Jaci Felipe da Costa e Valfrido da Silva dão dimensão dos significados do Iroko, nome de um dos orixás mais antigos nas tradições religiosas de matriz africana, representado pela espécie que pode medir até 30 metros de altura, com troncos que chegam a mais de dois metros de diâmetro.

"Mas que árvore é essa?", foi a pergunta de Julia Moura. A estudante de teatro divide as percepções sobre a exposição entre a surpresa de compreender a complexidade em torno do Iroko e os silêncios. "É difícil falar, porque é um campo do sentimento, sabe?", partilha. "Quando comecei a acompanhar os depoimentos, entendi que eles fazem também parte da árvore, é a genealogia deles e é muito tocante acessar essa história a partir da oralidade. Como pode que uma árvore que tem tanta história, que construiu uma casa tão bonita, tenha sido incendiada de uma maneira tão cruel e egoísta? É muito interessante aprender sobre isso."

Emocionada, Dália Rosenthal faz questão de destacar a rede de apoiadores da pesquisa que começou no Recife, mas foi semeada também no Sertão de Itaparica, em Pernambuco. "Nós estamos falando de uma ferida aberta na história do Brasil e uma ferida aberta da nossa construção territorial. Espero que a exposição crie espaços reflexivos e que essa ferida seja sentida", diz a artista. "Tenho muito interesse em trabalhar com memória e território na América Latina. Sabemos que ainda existe uma história oficial que a gente aprende na escola e que não traz as vozes de uma maneira plural. A gente ainda não tem o Manoel Papai nos livros", critica.

Integra ainda a montagem, uma semente da espécie, de tamanho imensamente distinto da árvore. Aproximadamente um milímetro. Mas também a terra que gestou uma série de novas mudas da gameleira-branca, produzidas durante a residência. Algumas delas foram plantadas na Comunidade Quilombola Poço Dantas, no município sertanejo de Inajá, a 396 km da capital pernambucana. Líder popular e presidente do Quilombo, Maria Antônia dos Santos, a Piabinha, prestigiou a abertura da exposição e falou dos significados. "Ela representa minha ancestralidade, porque cada uma das mudas recebeu o nome de alguém que já viveu dentro da comunidade."

Outra presença importante foi a do babalorixá da Casa de Tradições Afroindígenas IlêOca, Tiago Kfuzo Nagô, integrante do Movimento Negro Unificado. É dele a voz que lê uma série de registros do Arquivo Público, que datam do Século 19, e da Secretaria de Segurança Pública de Pernambuco. São denúncias de intolerância às comunidades que são vítimas há séculos. "Entendo que um trabalho como esse vem provocar a sociedade à reabertura de arquivos, para que possamos preencher as lacunas da nossa história com essas partes que faltam", celebra o babalorixá, ao recordar a Lei 10.639/2003, que institui o ensino do povo africano no Brasil.

Seguindo todos os protocolos sanitários necessários, a visitação pública de terças a sexta-feiras, das 10h às 16h. A Exposição "Tempo para Iroko" segue em cartaz até 28 de novembro.

Para ver em casa
A exposição da artista visual Dália Rosenthal estreou virtualmente no dia 7 de outubro, no canal da Fundação Joaquim Nabuco, no YouTube. Além do passeio pela instalação, a artista e pesquisadora conversa com o curador da Fundaj Moacir dos Anjos. Dália Rosenthal revela as nuances da exposição. “Ela é resultado e conclusão de um projeto que começou há sete anos. Um projeto que nasceu a partir de um pensamento sobre o território, a relação entre a cultura natural e as culturas criadas em cada espaço”, explica. No bate-papo, ambos conversaram sobre racismo, intolerância religiosa, território e meio ambiente. Assista na íntegra.


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