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Entrevista: Luan Nascimento, grafiteiro e educador do muHNE

Publicado: Quarta, 30 de Novembro de 2016, 11h39 | Última atualização em Quinta, 20 de Dezembro de 2018, 20h34 | Acessos: 2982

Por Juliana Costa

Artista por trás das paredes da nova sala de convivência da Fundação Joaquim Nabuco, que retratam, em grafite, o fundo do mar, Luan Nascimento é grafiteiro, graduado em história e monitor do Museu do Homem do Nordeste. Luan, entre uma correria e outra, da sua oficina a nova exposição do muHNE, concorda em sentar por alguns minutos para conceder essa entrevista. Explicando sobre a reforma pela qual a oficina está passando — oficina esta que também será palco de um de seus futuros projetos de grafite —, pega dois bancos e posiciona-os perto da mesa, colocando a lata de tinta que vinha carregando sobre ela, e, ainda segurando um pincel, recosta no banco para falar um pouco mais sobre sua arte. Não larga o pincel durante toda a conversa.

A seguir, a entrevista completa. Mais imagens do grafite de Luan na sala de convivência podem ser conferidas aqui.

De quem foi a ideia de grafitar a nova sala de convivência?

É o seguinte, o pessoal estava pensando e conversando que queriam uma sala de convivência, só que eles não sabiam mais ou menos como ia ser, se ia ter jogo, se não ia... Eles começaram a pensar no projeto e estavam pensando em pintar em três passos diferentes, três cores diferentes, que iam ser os ambientes. O do canto, onde tem uma prancha, vai ser a parte que tem a televisão. No meio, ia ser uma parte de leitura. No outro canto, uma parte de jogos. A princípio se pensou assim. Depois foram mudando, mudando, mudando, mas queriam alguém para pintar, aí falaram comigo e com Luiz [estagiário do Museu do Homem do Nordeste] sobre a proposta, a gente aceitou a ideia e dissemos “ah, vamos favor um projeto de alguma coisa que pudesse ser da sala de convivência, né?”. A gente pensou e maturou a ideia de ser um fundo do mar e começou a pegar elementos que se encaixassem naquela sala como uma sala realmente de descanso, uma sala de convivência para o pessoal no almoço. Então, a gente foi pegando elementos que pensávamos, estudou uma paleta de cores e construiu o desenho dessa forma, pensando em quais representações iríamos colocar: uma tartaruga, uns peixes... Foi mais uma ideia de ambientação, não foi muito um grafite com proposta de pensar questões políticas... Que é o que eu prefiro, né, mas enfim [risos]. A gente fez o projeto e já começou no sábado mesmo, foi muito rápido.

Desde quando você faz grafite?

Então, grafite faz uns quatro anos, desenho desde “pirralha” e, atualmente, tô estudando ilustração e vou começar a estudar mais pintura. Eu já faço, só que eu tô estudando mais agora, porque eu me formei, aí... 

E o que lhe levou ao grafite, foi isso de desenhar desde pequeno?

A ideia é a seguinte: desde “pirralha” eu viajo em apresentação imagética com cor, com personagem, que cria histórias. Então, apesar de fazer grafite, eu gosto muito de ilustração, animação, tudo que tem a ver com a ideia gráfica da construção do desenho, do cenário, de pensar realmente um trabalho. Eu viajo, eu acho massa. Tanto é que eu tenho alguns projetos de animação e algumas outras coisas que eu tô a fim de realizar em 2017, porque, justamente, eu acho que não só o grafite, não só a ilustração ou não só a história, não só as ciências sociais, completam a pessoa, a pessoa está sempre procurando outras ideias para estudar a partir do que você gosta e do que você está a fim. Eu gosto de grafite porque eu me divirto, primeiramente. Aliás, eu gosto do meu trabalho porque eu me divirto. No Museu [do Homem do Nordeste] eu me divirto. A primeira coisa que eu penso é nisso, se divertir trabalhando, fazer uma coisa que é massa, que eu realmente curto. Então, a ideia vem disso aí, de realmente curtir o que você faz. Agora, claro, tem alguns trabalhos que você pensa de forma mais política, outros nem tanto. Grafite e ilustração são meio que um hobby que eu levo a sério na perspectiva do futuro. Aliás, minha vida eu levo como um hobby [risos].

Você diria que seu grafite é mais político ou é mais você se expressando?

Atualmente, como eu tô trabalhando muito e estudando muito, eu tenho vários projetos que eu tô pré-produzindo em casa. Inclusive uma série que eu tô querendo expor próximo ano que discute a ideia da ação do tempo sobre as coisas, principalmente sobre imobiliário, carro... É uma série de pinturas que eu tô fazendo e eu quero que saia até a metade do ano. Muita pesquisa e tal, eu tô estudando isso. Eu tô acabando de fazer um curso de ilustração, vou começar pintura, mas eu já entendi um pouco, tô querendo entender melhor. Mas, principalmente, uma coisa que eu mais me identifico é uma coisa voltada ao trabalho mais pesado, digamos assim. 

E em quem você se inspira?

Ah, tem milhares de pessoas. Daqui do Brasil tem muita gente, eu curto muito Paulo Ito, de São Paulo; Rio de Janeiro tem uma rapaziada massa; a galera do MOF [Meeting of Favela], que é o maior evento de grafite comunitário do mundo; [Thiago] Tarm é um que também é massa lá do Rio... Sei lá, se for descer tem muita gente, também. Paraíba, Chico [Shiko], ilustração. Ceará, a galera do Acidum. Fora do Brasil também tem muita gente, tem uma galera da Europa mesmo que está em outra noção de grafite já. Tem um da Itália, NemO’s... Tem muita gente, sei lá! [risos]

Você assina com seu próprio nome ou você criou uma assinatura?

Na verdade, eu assino um LN só, não coloco meu nome todo, só as iniciais.

Onde você grafita normalmente? Rua, empresa, residência...

Eu já fiz muito grafite em escola, eu comecei mesmo, principalmente, em projetos em escolas. Eu e meu amigo íamos em escolas e fazíamos vários projetos, principalmente da prefeitura de Olinda, Paulista... A gente sempre fez vários trabalhos com menininhos. A escola chegava com o material e a gente sempre fazia vários projetos lá. Recife, algumas vezes... Eu pinto mais pro lado de Olinda, Paulista. Atualmente eu tô nesse processo, trabalhando muito, então não dá mais. 

Mas você pinta em Olinda, Paulista, nas ruas também ou só nas escolas?

Nas ruas. Já pintei muito em escola, mas hoje em dia eu não tenho tempo de parar e realmente fazer um projeto. Atualmente, eu já tenho outros projetos, eu quero começar a dar aula de ilustração também, relacionada ao que eu trabalho, que é acervo de museu. É outra ideia.

Como você descreve seu estilo e a evolução do seu trabalho? O que é que você tenta passar com sua arte?

Vai depender muito do ambiente, da situação, da forma de ver as coisas. A gente não está isolado no mundo, então acaba sendo tocado e retocado muitas vezes, em vários momentos. E isso influencia diretamente, muitas vezes você vê um trabalho e tem muita linguagem para o artista repassar. Vejo várias pessoas também que não são do grafite, mas têm várias dessas ideias, de o trabalho tocar. Muitas vezes você começa a entender melhor quando você está realmente discutindo, dialogando sobre várias outras questões. Por exemplo, a gente trabalha com exposição de arte contemporânea, tem muita informação dentro de uma exposição que a gente só vai conhecer realmente quando conhece a história. Os trabalhos muitas vezes têm muita história para contar, que é muito importante para você o entender. Pode não fazer parte do seu contexto, por isso você pode não entender. Vai depender muito desses contextos que a gente está. 

O que diferencia seu trabalho dos outros?

[risos] Você se entender no mundo é complicado... Atualmente, eu tô estudando muito uma estética que eu gosto mais. Não é a noção de grafite voltada para letra, bomb, mas sim voltada para a ideia de criar contextos, criar personagens, situações e narrativas através do teu trabalho. Atualmente, eu tô meio nessa transição, passando para isso. Por isso que eu tô pensando em trabalhar mais com painel: eu fiz um em Itapuama, há uns dois meses atrás. Passei dois dias internado na praia pintando em uma avenida abandonada. Esse trabalho foi mais uma coisa de brincadeira, de descontração. Fui eu e mais dois amigos, a gente criou três personagens praieiros, aqueles três macacos [aqui se refere aos Três Macacos Sábios, que cobrem, individualmente, a boca, os olhos e os ouvidos], só que todos eles estavam de camisa florida e com aqueles óculos 3D de praia. Eu tô muito nessa transição, pensando muito nessa ideia de criar contextos e de pensar em trabalhos de murais. Viajo em murais, acho massa. Inclusive é o que eu acompanho, hoje, no mundo e de referência também, todo dia eu vejo. Prefiro passar três dias pintando assim, conversar sobre o trabalho. Minha viagem é essa. 

Você acha que a vida como grafiteiro atrapalha a vida profissional e pessoal ou você consegue interligar tudo?

Eu trabalho com educação desde antes de começar na faculdade, em 2011: já dava aula, já fazia algumas coisas. A vida de educador veio primeiro do que a própria vida de começar a grafitar. Eu comecei a grafitar e pouco tempo depois eu entrei na faculdade. Eu acho que acompanhou essa transição da universidade, da experiência que se passa, assim como a mudança de pensamento que eu acho que meu curso me trouxe. Algumas temporadas eu realmente passei muito tempo sem pintar, mas estava produzindo ilustração, vendo roteiro de animação... Tem alguns trabalhos que eu vou fazendo junto com a galera também. E eu acho que eu sou muito assim: às vezes eu agarro o mundo com as pernas, mas eu sei que muitos trabalhos valem a pena ter contribuição.  Eu não consigo também ficar só parado, pensando no meu trabalho. Eu vou associando o que eu faço aos meus hobbies, ao que eu gosto de fazer, então eu acho que está tudo certo, tudo em um bolo só, no final das contas.

Muita gente diz que o grafite está sendo mais bem visto ultimamente, que antes tinha muito preconceito. Você concorda com essa opinião? 

Com certeza, o mundo é outro. A gente está numa sociedade totalmente de informação. É o seguinte: existem grupos que definem o que é certo ou errado na sociedade, e o grafite veio de um movimento totalmente periférico, junto com o piche, e, naquele contexto, não era aceito. Só que a diferença do grafite para uma obra dentro de um museu é que você chega e faz. A efemeridade e o desapego à obra são coisas que nunca antes se chegou na arte. O desapego, principalmente com a ideia do grafite, é totalmente diferente do que se entende sobre obra de arte, preservação. Tanto faz estar aqui hoje como chegar alguém e pintar amanhã. Existe um respeito também: em lugar onde tem piche, tem grafite, o pessoal não pinta por cima. Existe esse respeito e essa ideia de "não, é o trabalho do cara". Normalmente as pessoas respeitam. Inclusive é engraçado, né? Eu tinha feito um trabalho perto da minha casa e quando eu passei tinham três caras pintando. Quando eles me viram disseram “eita, foi o cara que pediu” e eu disse “nada, esse aí já cumpriu o ciclo dele”. A ideia é essa. O trabalho tem seu ciclo, eu acho. É claro que as pessoas levam para outro patamar: Bansky é um cara que a galera está tirando pedaço de muro dele e levando para dentro do museu, levando para galeria, vendendo por um milhão... O cara fez um trabalho ali, o outro recortou a parede e levou. É “facinho”. A galera está em outras ideias. Só que o grafite tem essa ideia do “chegou, fez, quem passou viu, quem não passou não viu, vai ver depois”. Mesmo você não gostando, você sai da sua casa e dá de frente a um grafite, a um piche. 

O grafite também passa por outro momento, economicamente: as pessoas entenderam que podem ganhar dinheiro com ele. A economia tem tudo a ver com aceitabilidade ou não, as pessoas que dizem que aquilo ali é bacana ou não vão dizer que é bom porque estão ganhando dinheiro também. Hoje a gente tem bienal de grafite, do mundo todo. Tem uma cidade na Alemanha que as empresas de tinta se juntaram para promover um evento que vai rolar em 2018, e eles tão fazendo [grafite] em vários lugares da cidade, já tem mais de 24 prédios. Quando chegar em 2018, o pessoal ganha um ciclo turístico só de grafite, construído em outra noção já. Então, economicamente, leva a almejar outras coisas, por isso que a aceitabilidade também vem da ideia econômica, porque, realmente, as pessoas começaram a colocar [o grafite] em lugares que as belas artes estão também. 

Você tem alguma dica para quem está começando agora?

Tenho, com certeza: veja referências. Para qualquer pessoa, a primeira coisa que eu digo é: o mínimo que você tem de obrigação é conhecer todo mundo da sua área, porque aí você começa a se entender. Você conhecer realmente suas referências, pessoas que não são diretamente ligadas à sua área, mas que auxiliam no seu trabalho, eu acho que é uma obrigação. Fora isso é você se jogar. 

Artista por trás das paredes da nova sala de convivência da Fundação Joaquim Nabuco, que retratam, em grafite, o fundo do mar, Luan Nascimento é grafiteiro, graduado em história e monitor do Museu do Homem do Nordeste. Luan, entre uma correria e outra, da sua oficina a nova exposição do muHNE, concorda em sentar por alguns minutos para conceder essa entrevista. Explicando sobre a reforma pela qual a oficina está passando — oficina esta que também será palco de um de seus futuros projetos de grafite —, pega dois bancos e posiciona-os perto da mesa, colocando a lata de tinta que vinha carregando sobre ela, e, ainda segurando um pincel, recosta no banco para falar um pouco mais sobre sua arte. Não larga o pincel durante toda a conversa.

A seguir, a entrevista completa.

 

De quem foi a ideia de grafitar a nova sala de convivência?

É o seguinte, o pessoal estava pensando e conversando que queriam uma sala de convivência, só que eles não sabiam mais ou menos como ia ser, se ia ter jogo, se não ia... Eles começaram a pensar no projeto e estavam pensando em pintar em três passos diferentes, três cores diferentes, que iam ser os ambientes. O do canto, onde tem uma prancha, vai ser a parte que tem a televisão. No meio, ia ser uma parte de leitura. No outro canto, uma parte de jogos. A princípio se pensou assim. Depois foram mudando, mudando, mudando, mas queriam alguém para pintar, aí falaram comigo e com Luiz [estagiário do Museu do Homem do Nordeste] sobre a proposta, a gente aceitou a ideia e dissemos “ah, vamos favor um projeto de alguma coisa que pudesse ser da sala de convivência, né?”. A gente pensou e maturou a ideia de ser um fundo do mar e começou a pegar elementos que se encaixassem naquela sala como uma sala realmente de descanso, uma sala de convivência para o pessoal no almoço. Então, a gente foi pegando elementos que pensávamos, estudou uma paleta de cores e construiu o desenho dessa forma, pensando em quais representações iríamos colocar: uma tartaruga, uns peixes... Foi mais uma ideia de ambientação, não foi muito um grafite com proposta de pensar questões políticas... Que é o que eu prefiro, né, mas enfim [risos]. A gente fez o projeto e já começou no sábado mesmo, foi muito rápido.

Desde quando você faz grafite?

Então, grafite faz uns quatro anos, desenho desde “pirralha” e, atualmente, tô estudando ilustração e vou começar a estudar mais pintura. Eu já faço, só que eu tô estudando mais agora, porque eu me formei, aí...

E o que lhe levou ao grafite, foi isso de desenhar desde pequeno?

A ideia é a seguinte: desde “pirralha” eu viajo em apresentação imagética com cor, com personagem, que cria histórias. Então, apesar de fazer grafite, eu gosto muito de ilustração, animação, tudo que tem a ver com a ideia gráfica da construção do desenho, do cenário, de pensar realmente um trabalho. Eu viajo, eu acho massa. Tanto é que eu tenho alguns projetos de animação e algumas outras coisas que eu tô a fim de realizar em 2017, porque, justamente, eu acho que não só o grafite, não só a ilustração ou não só a história, não só as ciências sociais, completam a pessoa, a pessoa está sempre procurando outras ideias para estudar a partir do que você gosta e do que você está a fim. Eu gosto de grafite porque eu me divirto, primeiramente. Aliás, eu gosto do meu trabalho porque eu me divirto. No Museu [do Homem do Nordeste] eu me divirto. A primeira coisa que eu penso é nisso, se divertir trabalhando, fazer uma coisa que é massa, que eu realmente curto. Então, a ideia vem disso aí, de realmente curtir o que você faz. Agora, claro, tem alguns trabalhos que você pensa de forma mais política, outros nem tanto. Grafite e ilustração são meio que um hobby que eu levo a sério na perspectiva do futuro. Aliás, minha vida eu levo como um hobby [risos].

Você diria que seu grafite é mais político ou é mais você se expressando?

Atualmente, como eu tô trabalhando muito e estudando muito, eu tenho vários projetos que eu tô pré-produzindo em casa. Inclusive uma série que eu tô querendo expor próximo ano que discute a ideia da ação do tempo sobre as coisas, principalmente sobre imobiliário, carro... É uma série de pinturas que eu tô fazendo e eu quero que saia até a metade do ano. Muita pesquisa e tal, eu tô estudando isso. Eu tô acabando de fazer um curso de ilustração, vou começar pintura, mas eu já entendi um pouco, tô querendo entender melhor. Mas, principalmente, uma coisa que eu mais me identifico é uma coisa voltada ao trabalho mais pesado, digamos assim.

E em quem você se inspira?

Ah, tem milhares de pessoas. Daqui do Brasil tem muita gente, eu curto muito Paulo Ito, de São Paulo; Rio de Janeiro tem uma rapaziada massa; a galera do MOF [Meeting of Favela], que é o maior evento de grafite comunitário do mundo; [Thiago] Tarm é um que também é massa lá do Rio... Sei lá, se for descer tem muita gente, também. Paraíba, Chico [Shiko], ilustração. Ceará, a galera do Acidum. Fora do Brasil também tem muita gente, tem uma galera da Europa mesmo que está em outra noção de grafite já. Tem um da Itália, NemO’s... Tem muita gente, sei lá! [risos]

Você assina com seu próprio nome ou você criou uma assinatura?

Na verdade, eu assino um LN só, não coloco meu nome todo, só as iniciais.

Onde você grafita normalmente? Rua, empresa, residência...

Eu já fiz muito grafite em escola, eu comecei mesmo, principalmente, em projetos em escolas. Eu e meu amigo íamos em escolas e fazíamos vários projetos, principalmente da prefeitura de Olinda, Paulista... A gente sempre fez vários trabalhos com menininhos. A escola chegava com o material e a gente sempre fazia vários projetos lá. Recife, algumas vezes... Eu pinto mais pro lado de Olinda, Paulista. Atualmente eu tô nesse processo, trabalhando muito, então não dá mais.

Mas você pinta em Olinda, Paulista, nas ruas também ou só nas escolas?

Nas ruas. Já pintei muito em escola, mas hoje em dia eu não tenho tempo de parar e realmente fazer um projeto. Atualmente, eu já tenho outros projetos, eu quero começar a dar aula de ilustração também, relacionada ao que eu trabalho, que é acervo de museu. É outra ideia.

Como você descreve seu estilo e a evolução do seu trabalho? O que é que você tenta passar com sua arte?

Vai depender muito do ambiente, da situação, da forma de ver as coisas. A gente não está isolado no mundo, então acaba sendo tocado e retocado muitas vezes, em vários momentos. E isso influencia diretamente, muitas vezes você vê um trabalho e tem muita linguagem para o artista repassar. Vejo várias pessoas também que não são do grafite, mas têm várias dessas ideias, de o trabalho tocar. Muitas vezes você começa a entender melhor quando você está realmente discutindo, dialogando sobre várias outras questões. Por exemplo, a gente trabalha com exposição de arte contemporânea, tem muita informação dentro de uma exposição que a gente só vai conhecer realmente quando conhece a história. Os trabalhos muitas vezes têm muita história para contar, que é muito importante para você o entender. Pode não fazer parte do seu contexto, por isso você pode não entender. Vai depender muito desses contextos que a gente está.

O que diferencia seu trabalho dos outros?

[risos] Você se entender no mundo é complicado... Atualmente, eu tô estudando muito uma estética que eu gosto mais. Não é a noção de grafite voltada para letra, bomb, mas sim voltada para a ideia de criar contextos, criar personagens, situações e narrativas através do teu trabalho. Atualmente, eu tô meio nessa transição, passando para isso. Por isso que eu tô pensando em trabalhar mais com painel: eu fiz um em Itapuama, há uns dois meses atrás. Passei dois dias internado na praia pintando em uma avenida abandonada. Esse trabalho foi mais uma coisa de brincadeira, de descontração. Fui eu e mais dois amigos, a gente criou três personagens praieiros, aqueles três macacos [aqui se refere aos Três Macacos Sábios, que cobrem, individualmente, a boca, os olhos e os ouvidos], só que todos eles estavam de camisa florida e com aqueles óculos 3D de praia. Eu tô muito nessa transição, pensando muito nessa ideia de criar contextos e de pensar em trabalhos de murais. Viajo em murais, acho massa. Inclusive é o que eu acompanho, hoje, no mundo e de referência também, todo dia eu vejo. Prefiro passar três dias pintando assim, conversar sobre o trabalho. Minha viagem é essa.

Você acha que a vida como grafiteiro atrapalha a vida profissional e pessoal ou você consegue interligar tudo?

Eu trabalho com educação desde antes de começar na faculdade, em 2011: já dava aula, já fazia algumas coisas. A vida de educador veio primeiro do que a própria vida de começar a grafitar. Eu comecei a grafitar e pouco tempo depois eu entrei na faculdade. Eu acho que acompanhou essa transição da universidade, da experiência que se passa, assim como a mudança de pensamento que eu acho que meu curso me trouxe. Algumas temporadas eu realmente passei muito tempo sem pintar, mas estava produzindo ilustração, vendo roteiro de animação... Tem alguns trabalhos que eu vou fazendo junto com a galera também. E eu acho que eu sou muito assim: às vezes eu agarro o mundo com as pernas, mas eu sei que muitos trabalhos valem a pena ter contribuição.  Eu não consigo também ficar só parado, pensando no meu trabalho. Eu vou associando o que eu faço aos meus hobbies, ao que eu gosto de fazer, então eu acho que está tudo certo, tudo em um bolo só, no final das contas.

Muita gente diz que o grafite está sendo mais bem visto ultimamente, que antes tinha muito preconceito. Você concorda com essa opinião?

Com certeza, o mundo é outro. A gente está numa sociedade totalmente de informação. É o seguinte: existem grupos que definem o que é certo ou errado na sociedade, e o grafite veio de um movimento totalmente periférico, junto com o piche, e, naquele contexto, não era aceito. Só que a diferença do grafite para uma obra dentro de um museu é que você chega e faz. A efemeridade e o desapego à obra são coisas que nunca antes se chegou na arte. O desapego, principalmente com a ideia do grafite, é totalmente diferente do que se entende sobre obra de arte, preservação. Tanto faz estar aqui hoje como chegar alguém e pintar amanhã. Existe um respeito também: em lugar onde tem piche, tem grafite, o pessoal não pinta por cima. Existe esse respeito e essa ideia de "não, é o trabalho do cara". Normalmente as pessoas respeitam. Inclusive é engraçado, né? Eu tinha feito um trabalho perto da minha casa e quando eu passei tinham três caras pintando. Quando eles me viram disseram “eita, foi o cara que pediu” e eu disse “nada, esse aí já cumpriu o ciclo dele”. A ideia é essa. O trabalho tem seu ciclo, eu acho. É claro que as pessoas levam para outro patamar: Bansky é um cara que a galera está tirando pedaço de muro dele e levando para dentro do museu, levando para galeria, vendendo por um milhão... O cara fez um trabalho ali, o outro recortou a parede e levou. É “facinho”. A galera está em outras ideias. Só que o grafite tem essa ideia do “chegou, fez, quem passou viu, quem não passou não viu, vai ver depois”. Mesmo você não gostando, você sai da sua casa e dá de frente a um grafite, a um piche.

O grafite também passa por outro momento, economicamente: as pessoas entenderam que podem ganhar dinheiro com ele. A economia tem tudo a ver com aceitabilidade ou não, as pessoas que dizem que aquilo ali é bacana ou não vão dizer que é bom porque estão ganhando dinheiro também. Hoje a gente tem bienal de grafite, do mundo todo. Tem uma cidade na Alemanha que as empresas de tinta se juntaram para promover um evento que vai rolar em 2018, e eles tão fazendo [grafite] em vários lugares da cidade, já tem mais de 24 prédios. Quando chegar em 2018, o pessoal ganha um ciclo turístico só de grafite, construído em outra noção já. Então, economicamente, leva a almejar outras coisas, por isso que a aceitabilidade também vem da ideia econômica, porque, realmente, as pessoas começaram a colocar [o grafite] em lugares que as belas artes estão também.

Você tem alguma dica para quem está começando agora?

Tenho, com certeza: veja referências. Para qualquer pessoa, a primeira coisa que eu digo é: o mínimo que você tem de obrigação é conhecer todo mundo da sua área, porque aí você começa a se entender. Você conhecer realmente suas referências, pessoas que não são diretamente ligadas à sua área, mas que auxiliam no seu trabalho, eu acho que é uma obrigação. Fora isso é você se jogar. 

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