Ir direto para menu de acessibilidade.
Página inicial > Centro de Estudos de Cultura, Memória e Identidade(Cecim) > Blog da Fundação > Entrevistas > AUDIODESCRIÇÃO NO CINEMA EM PERNAMBUCO: “ESTAMOS NUM MOMENTO DE TRANSIÇÃO E APRENDIZADO”, AFIRMA LILIANA TAVARES, DO FESTIVAL VEROUVINDO
Início do conteúdo da página

AUDIODESCRIÇÃO NO CINEMA EM PERNAMBUCO: “ESTAMOS NUM MOMENTO DE TRANSIÇÃO E APRENDIZADO”, AFIRMA LILIANA TAVARES, DO FESTIVAL VEROUVINDO

Criado: Segunda, 18 de Abril de 2016, 12h41 | Publicado: Segunda, 18 de Abril de 2016, 12h41 | Última atualização em Quinta, 20 de Dezembro de 2018, 20h34 | Acessos: 4154

Cinema São Luiz na 2ª edição do VerOuvindo, em 2015 (Foto: Divulgação)

Por Lara Ximenes

Depois de realizar uma sessão adaptada para crianças com deficiências diversas na I Semana Estadual de Conscientização sobre Doenças Raras e de aproximar o público adulto com deficiência dos filmes de cunho erótico e sexual com a mostra Cine às Escuras, o Cinema do Museu da Fundação Joaquim Nabuco recebe outra ação inclusiva - a terceira edição do Festival VerOuvindo, projeto incentivado pelo Funcultura e realizado pela Com Acessibilidade Comunicacional, que será realizado entre 20 e 24 de abril. Além do Museu, os filmes também serão exibidos no Cinema São Luiz. A Fundação Joaquim Nabuco também sediará, na Sala Calouste Gulbenkian, a mesa-redonda A difusão da audiodescrição.

O festival, que já aconteceu no Cinema da Fundação em edições passadas, apresenta sua programação voltada para acessibilidade por meio de filmes com audiodescrição. Esse ano, destacam-se a Sessão Memória, novidade que celebra os 20 anos de lançamento do filme Baile Perfumado (Lírio Ferreira), exibindo-o pela primeira vez com recursos comunicacionais (audiodescrição e libras), e a Sessão Especial GloboNews, com o documentário Boa Noite Solidão, produzido pela emissora e dirigido pelo jornalista Geneton Moraes Neto, que após a sessão participará de um bate-papo com o público - além disso, o festival apresentará a cantora gaúcha Luíza Caspary, que realiza pela primeira vez em Recife um pocket show acessível no Cinema São Luiz. A programação completa pode ser conferida no site oficial do evento.

Na entrevista abaixo, Liliana Tavares, a coordenadora do VerOuvindo e gestora da Com Acessibilidade Comunicacional, conversou sobre a urgência da acessibilidade nos meios culturais e outros desafios e aprendizados ao longo dos três anos de festival. Liliana também é psicóloga e uma das responsáveis pelo livro Notas Proêmias – Acessibilidade Comunicacional para Produções Culturais, lançado em 2013 pelo Funcultura, onde sugere caminhos para realização de produções acessíveis para pessoas com deficiência visual ou auditiva.

Blog da Fundação - Quando surgiu o interesse para fazer o festival?

Liliana Tavares – Era uma área da cultura em Pernambuco que ainda não estava sendo acessível. Já tínhamos trabalhado em teatros e exposições, mas não no cinema. Entretanto a origem da audiodescrição é no audiovisual. Ela surge de uma dissertação de mestrado do americano Gregory Frazier, que assistia filmes com um amigo cego e começou a descrevê-los para ele. Gregory resolveu estudar isso, buscando diretrizes, regras e formas para facilitar o trabalho do futuro audiodescritor. Então acho que com o VerOuvindo voltamos um pouco às origens da audiodescrição, da história dela, que era proporcionar uma experiência diferente para as pessoas com deficiência visual no cinema, abrindo mais um espaço para elas poderem frequentar. Como eu também sempre gostei de cinema, me quesionava como era ir ao cinema para aquelas pessoas com deficiência e o que elas poderiam estar perdendo do filme, apesar de ouvirem o áudio - algumas tinham um amigo ou namorado(a) para descrever o filme, e essas pessoas que ajudavam na descrição acabavam deixando de ver um pouco do filme também. A gente quer ocupar o lugar desses narradores como profissionais, para que todos possam usufruir da sétima arte. Agora eu também estou na universidade, fazendo doutorado em comunicação PPGCOM/UFPE (Programa de Pós Graduação em Comunicação/Universidade Federal de Pernambuco) sobre audiodescrição pra filmes e fotografia. Então é uma coisa que volta às origens também né?

BF – E qual foi o pontapé inicial para o VerOuvindo começar?

Liliana - O VerOuvindo é meu projeto final de um curso de produção cultural, que a Fundarpe e a Poli realizaram em 2012/2013. O meu projeto final do curso foi esse festival, que eu escrevi pro Funcultura e ele acabou passando. Foi nesse curso que eu conheci Karina Galindo, que também é produtora do VerOuvindo, e que disse "olhe, se você inscrever eu estou com você, inscreva e você vai junto comigo". Ela se interessa, ela me ajuda muito na formação de público, a trazer as pessoas para o cinema e a gente hoje em dia conta com uma equipe grande. É importante registrar que todos os filmes que a gente faz com audiodescrição, a gente conta com uma pessoa com deficiência visual para revisar os filmes. Isso faz parte da audiodescrição e também faz a gente cumprir o lema que a ONU incorporou e divulga: "nada sobre nós sem nós". Então nada sobre as pessoas com deficiência sem que elas participem e opinem. Sempre que tem uma produção de audiodescrição ou de libras, existe um consultor cego ou surdo para revisar o roteiro antes dele ser gravado. Isso é muito importante de ser dito.

BF - O que falta para a inclusão ter vez nos espaços culturais de Recife? É uma questão de estrutura ou interesse?

Liliana – O tema (pessoas com deficiência) não é explorado na educação. Está começando agora, e a sociedade como um tudo, incluindo os produtores culturais, não foram acostumados a pensar, falar e discutir sobre a necessidade das pessoas com deficiência. E essas pessoas começam a buscar e desejar o seu lugar na sociedade, a participar do espaço público e as leis começam a mudar também, para solicitar que algumas atitudes sejam revistas. Os produtores de certa forma são pegos de surpresa porque na verdade eles ainda pensam no orçamento, não conseguem pensar no público que vão atingir, ou em como aquela obra pode impactar mais pessoas. Então eu acho que são questões variadas - o contexto é múltiplo, e o que a gente tem que pensar atualmente é o que aconteceu, por exemplo, aqui em Pernambuco: a gente sabe que a grande produção da cultura pernambucana é incentivada pelo Funcultura. E o Funcultura há mais o menos dois anos atrás começa a pontuar os projetos que incluem acessibilidade comunicacional - audiodescrição, libras, braile ou qualquer outra iniciativa que pudesse incluir pessoas com deficiência e baixa mobilidade em geral. Foi a partir daí que os produtores começaram a ter acesso a leis e sobre esse tema. No livro Notas Proêmias, falávamos um pouco sobre as barreiras atitudinais que nós todos possuímos e atuamos com elas sem perceber - quando por exemplo questionamos por que uma pessoa cega precisa de audiodescrição se ela entende" o filme. Tudo isso presumido sem que escutássemos a pessoa com deficiência. Mas essas pessoas agora estão dispostas a compreeder seu direito no espaço público e a querer interagir com a cultura em geral, e isso faz com que a acessibilidade seja requisitada. Estamos num momento de transição e aprendizado - tanto o público quanto os produtores. É preciso entender como divulgar e se aproximar dessas pessoas, que por sua vez estão aprendendo a frequentar esses lugares que antes não frequentavam e eram excluídas - teatros, cinemas, exposições. Da mesma forma, o poder público também precisa aprender a arrumar a casa - os locais precisam ter acessibilidade arquitetônica (rampa, piso podotátil) e estrutural, como aparelhos de transmissão da audiodescrição e as cabines acústicas - isso aliviaria o orçamento com o produtor, que paga pela audiodescrição e pela estrutura nos eventos acessíveis e pela equipe que vai trabalhar com acessibilidade. Não há costume na sociedade em pagar aqueles que vão trabalhar com pessoas com deficiência - isso é sempre visto como caridade. Mas trabalhar com isso envolve trabalho intenso, estudo, dedicação e diálogo. Eu acho que a acessibilidade vai existir de verdade em todos os eventos quando os equipamentos públicos estiverem melhores adaptados, os produtores estiverem mais capacitados para entender a acessibilidade e o público e também quando os profissionais da acessibilidade tiverem mais espaço e respeito para mostrarem seu trabalho, e que saibam o valor desse profissional.

BF - O que o VerOuvindo aprendeu desde a sua primeira edição? O que mudou?

Liliana - O festival cresceu e amadureceu. A gente aprendeu que tem mais pessoas fazendo audiodescrição interessadas no cinema. No primeiro VerOuvindo, tivemos dez inscritos na mostra competitiva, muito porque ligávamos pros audiodescritores do Brasil pedindo que eles inscrevessem filmes, incentivando. No segundo ano, sem pedir, tivemos onze inscritos. Este ano tivemos 28 inscritos nacionalmente, e haverá premios em dinheiro. Ficamos muito felizes com isso pois a mostra competitiva é o nosso "carro chefe", a gente acredita que a audiodescrição precisa ser uma categoria premiada no cinema - assim como existe melhor filme, melhor direção e melhor figurino. Sabemos e entendemos que a audiodescrição é outro produto, é o filme como um áudio - um produto que pode ser consumido de outra forma. A audiodescrição tem beleza e valor artístico e por isso a gente premia o roteiro de audiodescrição e a narração. Isso é uma das coisas que o festival incentiva. A gente percebeu também que o VerOuvindo, com o tempo, não precisará mais fazer audiodescrição para filmes e sim receber as produções que já estão vindo com audiodescrição, feita com apoio financeiro da Ancine e do Fundo Setorial do Audiovisual. A ideia é que daqui pra frente esses filmes que vêm com acessbilidade possam concorrer na mostra competitiva do VerOuvindo, para que eles sejam premiados. Assim o filme ganha mais um prêmio no hall de opções que eles podem ganhar e os audiodescritores também são valorizados. Outra novidade é a Sessão Memória, que vai tornar acessivel também filmes antigos importantes para nossa história, fazendo a audiodescrição destes. Por outro lado, os filmes novos também são incentivados pelo festival com o prêmio Serviço VerOuvindo de Audiodescrição, onde três curtas premiados na última edição do FestCine - Festival de Curtas de Pernambuco ganham audiodescrição e são exibidos no VerOuvindo, como forma de incentivar mesmo os novos produtores na audiodescrição e tornar seus filmes mais acessíveis.

Fim do conteúdo da página

Nós usamos cookies para melhorar sua experiência de navegação no portal. Ao utilizar o fundaj.gov.br, você concorda com a política de monitoramento de cookies. Para ter mais informações sobre como isso é feito, acesse Política de privacidade. Se você concorda, clique em ACEITO.